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As características de uma empresa de qualidade para se investir

O gestor de fundos mais proeminente do Reino Unido acredita que a aposta de longo prazo em empresas com rentabilidades sustentadas é a melhor estratégia para um investidor. Terry Smith, também conhecido como o “Warren Buffett inglês”, aconselha os investidores a escolherem empresas que compreendam bem. Aos 70 anos, este eurocético atualmente é o CEO da Fundsmith, cargo que anteriormente ocupou na Tullett Prebon e na Collins Stewart.

Terry começou sua carreira no Barclays Bank, onde desenvolveu seu interesse pela análise de ações. Em sua trajetória, sempre teve uma grande exposição pública, sobretudo desde que publicou a sua obra mais conhecida “Accounting for Growth”, em 1990. Neste livro explicou como algumas empresas destacadas na FTSE 100 usavam técnicas contábeis enganosas. 

Smith, que gere uma carteira de 17 bilhões de libras, prefere comprar ações de um seleto grupo de empresas consolidadas, retendo-as por um longo período de tempo. Para além de suas atividades no setor financeiro, ele é um comentarista influente na mídia e autor, contribuindo regularmente para publicações como o Financial Times. Até 2013, mantinha um blog entitulado “Terry Smith Straight Talking”, onde discutia de forma abrangente questões financeiras e políticas. Como eurocético, Smith foi um defensor destacado da saída do Reino Unido da União Europeia.

Neste video, as “Características de uma empresa de qualidade (2022)”, disponível no Youtube, Terry Smith explica que as melhores empresas para investir são aquelas que têm um crescimento constante, que consegue bons retornos sobre o capital investido. Confira aqui os pontos principais:

Terry Smith, CEO da Fundsmith: “É muito melhor comprar uma empresa maravilhosa a um preço justo do que uma empresa justa a um preço maravilhoso”

“A primeira e mais importante medida de uma boa empresa em termos financeiros é que ela gera um alto retorno sobre o capital operacional em dinheiro”, defende Terry Smith. Sua gestora de fundos possui retornos que impressionam: desde 2010 até este ano, o valor do Fundsmith Equity cresceu 533%, acima da S&P 500 e muito mais que o FTSE. No vídeo, Smith explica qual a sua estratégia, que o fez bilionário e o torna um dos mais procurados analistas financeiros da Europa. 

Para quantificar o retorno que pretende, este investidor não podia ser mais claro: o retorno tem de ser um número alto. Entretanto, em suas palavras, “Não adianta ter retornos maravilhosos se você estiver limitado a um segmento, nicho ou geografia muito pequenos e não puder empregar o dinheiro que está sendo gerado para fazer o negócio crescer”.

Comecemos então por definir o que é uma boa companhia. Como se vê no quadro seguinte, é aquela que tem um retorno elevado sobre o capital operacional em dinheiro; a que tem um crescimento que permite um reinvestimento dos cash flows com altas taxas de retorno e que garante uma vantagem competitiva que se prolonga no tempo.

(“O que é uma boa empresa?” Terry Smith: The value investing channel)

Porque os altos retornos de capital são importantes? As empresas são como pessoas, e as pessoas complicam demais a análise, diz Terry Smith. As empresas têm um custo de capital e um retorno sobre o capital. Se elas geram um retorno consistentemente acima de seu custo de capital, então o valor da empresa cresce ao longo do tempo. Se gerarem um retorno abaixo de seu custo de capital consistentemente, o valor diminui ao longo do tempo: “Pense nisso em termos pessoais. Se você pegar dinheiro emprestado no banco a 5% e investir com um retorno de 18%, você ficaria mais rico. Se você pegar um empréstimo no banco a 5% e investir com um retorno inferior a 2%, você ficaria mais pobre. Não precisamos entrar em matemática avançada aqui ou em um nível particularmente sofisticado de pensamento. É um fato. Isso é o que acontece”, sublinha. 

 

(“Porque é que o retorno sobre o capital é importante?” Terry Smith: The value investment channel)

Smith cita o número dois de Warren Buffett, Charlie Munger, para explicar que é pior investir num negócio com um bom preço de base mas que ganha 6% sobre o capital ao longo de quarenta anos, do que um negócio que parece inicialmente caro mas que vai ganhar 18% sobre o capital ao longo de vinte ou trinta anos. “Ele está nos dizendo algo muito importante aqui. Isso não é uma teoria. Ele não está apresentando uma teoria de investimento. É um fato matemático”, conclui o investidor britânico. 

Segundo ele, um dos problemas de quem procura investir é a forma como olha para o negócio: “As pessoas gastam quase todo o esforço pensando se algo é barato ou caro (…) e muito pouco decidindo se é um negócio de alta qualidade que realmente desejam possuir e que pode se valorizar”. Por isso, quando começou a trabalhar no mercado financeiro, arranjou um diário e dividiu-o em duas colunas: “E toda vez no negócio de investimentos, alguém me perguntava se uma empresa ou estratégia era de alta qualidade, tinha altos retornos sobre o capital, eu colocava um visto em uma coluna. E toda vez que diziam: ‘Mas é barato ou caro?’ eu colocava um visto naquela coluna. Eu teria muito, muito mais vistos na pergunta: É barato ou caro?”

Nesta sessão, o fundador da Fundsmith, explica que não tem grande interesse em empresas com baixo retorno sobre o capital, dando o exemplo da indústria de aviação, “uma máquina para perder dinheiro, basicamente”.  E não faz sentido investir em empresas com retornos iguais. Talvez isso explique que a carteira deste fundo tenha um limitado número de ações, pouco mais do que duas dezenas.

Outro aspecto aqui sublinhado é que não adianta investir em empresas que não conseguem crescer mais. Procuramos por um negócio que tenha uma fonte de crescimento secular, não cíclico, que não sobe e desce: ‘Tudo tem um pouco de ciclicidade, mas procuramos empresas que, tanto no pico quanto no vale do ciclo de negócios, sejam maiores do que eram em partes anteriores do ciclo de negócios. Que cresçam não em todo período ou todo ano, mas que cresçam ao longo do tempo.

Oportunidades de investimento não faltam

Chegamos assim ao cálice sagrado, ao Santo Graal, que nos é exibido por Smith. Onde estão as oportunidades? Uma delas, diz, vem da população residente nos países em desenvolvimento, que precisam dos benefícios do consumo e aspiram a conseguir uma melhoria de vida. “Quando as pessoas nos países em desenvolvimento ultrapassam um certo nível de renda disponível, elas se tornam consumidores”, recorda.

Mas no mundo mais desenvolvido, o fenômeno é diferente, há aquilo que chama de premiumização. “Podemos não estar consumindo mais, na maioria das vezes, mas estamos consumindo melhor. Podemos aprimorar o que fazemos. Então, seja lá o que estivermos falando sobre consumir, há uma boa chance de que subiremos a curva em termos da marca dos bens que estamos consumindo ao longo do tempo e melhorando”. Outro grande grupo de consumo, e este geralmente secundarizado, são as populações envelhecidas, que “aumentam o consumo de várias coisas, incluindo cuidados médicos”. E, portanto, podem ser um grande impulsionador para certas empresas. 

Segundo ele, ainda existem muitas oportunidades para impulsionar certar empresas. E prossegue, por exemplo: “Cerca de dois terços do mundo que precisa de correção visual ainda não a têm. Eles ainda não têm acesso a óculos de leitura e outras formas de correção visual. Eles terão com o tempo, e claramente, isso será uma fonte de crescimento para empresas como a Essilor e assim por diante, que estão no negócio de fabricar e vender óculos”.

Os exemplos fornecidos não terminam, nesta apresentação feita no canal de Youtube do “The value investing channel”, com participação de alguns dos mais reputados investidores. O quadro seguinte sintetiza essas oportunidades. Algumas resultam simplesmente nas mudanças na forma como vivemos, como é o caso das alterações na forma de pagamento, por exemplo. Mais de oitenta por cento das transações ainda são feitas em dinheiro, mas o cenário está mudando rapidamente, e as novas gerações já nem percebem: “tudo o que eles têm que fazer basicamente é ir até o balcão com o telefone no bolso e pagar por algo. E isso claramente é o futuro”.

Mas a área em que Terry Smith aposta como tendo um caminho muito longo pela frente, pode surpreender. Trata-se dos negócios relacionados a animais de estimação ou animais de companhia, que “como qualquer pessoa que os tenha saberá, estão em uma jornada para se tornarem membros plenos da família”. Os números são incríveis: nos Estados Unidos, mais de 10 bilhões de dólares por ano são gastos em alimentos dietéticos para animais de estimação.

(“O reinvestimento necessita de um crescimento sustentado”, Terry Smith: The value investment channel)

Quarenta por cento dos adultos americanos moram sozinhos. A pandemia mostrou que um animal de estimação era um ponto de contato importante: “Se você quisesse um gato ou um cachorro na América durante o lockdown, você realmente teria entrado em uma lista de espera em um abrigo para obtê-lo”. Todos querem tratar bem os seus companheiros, e isso significa uma excelente oportunidade de negócio para os investidores mais atentos.

Finalmente, a concorrência. Se a empresa está fazendo um bom trabalho e consegue boas margens, tenha certeza que outros tentarão conquistar uma fatia do mercado. Então é preciso encontrar estratégias para impedir que a concorrência entre, ou pelo menos dificultar esse processo. Warren Buffet, diz Smith, entende que “grandes negócios não apenas têm grandes retornos e fontes de crescimento, eles têm um fosso ao redor do castelo para protegê-los desses ataques”. 

Mas como se constrói esse fosso? De várias formas. Uma delas é investir numa marca forte, preservada com marketing, publicidade, promoção e desenvolvimento. E, como se sabe, pagamos mais por uma marca do que por outra. Além disso, a cadeia de produção já é uma boa arma contra a concorrência, “Se você quiser competir com algumas das empresas modernas de laticínios, especialmente no mundo em desenvolvimento, como Nestlé e Danone, você terá que encontrar suas próprias fazendas de gado para converter as fazendas leiteiras e construir a cadeia de suprimentos refrigerada e o processamento, e você terá que colocar suas próprias geladeiras nas lojas para armazenar esses produtos”. 

Assim como as empresas que fornecem bens ou serviços que criam uma dependência para manutenção, peças ou serviços estão numa posição de vantagem em relação aqueles que querem entrar no mercado: “uma vez que você comprou um elevador Coney ou Schindler ou um elevador Otis, há 75% de chance de você assinar o contrato de manutenção com eles, é aí que o dinheiro real é feito”. Outro exemplo é o software, que pode criar um elevado grau de dependência, afirma o CEO da Fundsmith: “pessoas que fazem software que vai para o seu computador, para o seu sistema operacional ou para executar a sua chamada de conferência como temos agora, pessoas que fazem software de reserva de companhias aéreas, software de reserva de hotéis, software de processamento de folha de pagamento, etc., etc., uma vez que você tem essas coisas, elas se tornam muito incorporadas, muito difíceis de mudar”. Este é, para Smith, um dos negócios ideais, uma vez que é consistente, duradouro, e garantido.

As patentes são o último elemento de defesa contra a concorrência. Elas são a forma menos favorita de vantagem competitiva, na verdade, porque elas expiram. Mas se a base estiver instalada e a marca também, mesmo sem a patente é possível continuar com um negócio fortalecido: “o Sr. Otis patenteou o elevador de segurança por volta de 1858, quero dizer, sua patente havia expirado nos anos 1870, no entanto, ainda tem a posição número um, basicamente, então nós pensamos que o desenvolvimento de marcas e bases instaladas é muito mais importante do que patentes”.

Em suma, a defesa contra a concorrência pode ser feita através da marca, de uma base, ou de patentes, sendo certo que quanto mais largo e fundo for esse “fosso”, como ele chama, mais difícil é aos outros penetrarem nos seus negócios. 

Assista a live completa com Terry Smith clicando aqui.